É bem verdade que a fome no Brasil voltou a nos assombrar nestes últimos cinco anos. Mas, com a Pandemia, os números ficaram ainda mais alarmantes. Em 2020, mais de 116 milhões de pessoas se sentiam inseguras em relação ao que ter sob a mesa.
Os dados são da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (PENSSAN), formada por pesquisadores e profissionais de diversas áreas, e estão registrados no Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 (VIGISAN) que foi lançado em abril de 2021 no Brasil.
De acordo com a pesquisa, mais de 116 milhões de pessoas conviviam com algum grau de insegurança alimentar, dos quais 43,3 milhões não tinham alimentos suficientes e 19 milhões passavam fome.
A insegurança alimentar inclui desde a alimentação de má qualidade, instabilidade no acesso a alimentos e até a fome.
O estudo ainda apontou que a insegurança alimentar está mais presente em domicílios da área rural (12%) e em 8,5% da área urbana. Isso mostra que, mesmo perto da área de produção e cultivo dos alimentos, as pessoas que vivem na zona rural ainda são as mais afetadas.
Segundo especialistas, o elevado índice de insegurança alimentar nas áreas rurais no Brasil pode ser justificado por vários fatores.
Entre eles estão o maior percentual de pobreza no campo, a elevada concentração no acesso à terra, a limitação dos recursos hídricos e a falta de acesso das comunidades rurais aos equipamentos públicos de segurança alimentar e às redes privadas de solidariedade e doações.
Na pandemia, todos esses fatores ainda somaram-se ao menor acesso dos pequenos produtores rurais aos mercados, o que prejudicou a condição de renda desses agricultores.
Uma das soluções para o problema, porém, seria utilizar e explorar mais os recursos e alimentos produzidos no Cerrado brasileiro.
O Cerrado, segundo maior bioma da América do Sul, conhecido como o “berço das águas” e a savana com a maior biodiversidade do planeta, pode ajudar a combater a fome no Brasil, principalmente por contar com múltiplas identidades e modos de vida.
“Vivemos em um dos biomas mais incríveis do mundo e talvez o mais importante. Temos uma vasta variedade de fauna e flora e só de frutos comestíveis temos mais de mil opções. Se soubéssemos o quão rico é nosso Cerrado, não haveria espaço para pessoas passarem fome” , afirma Vinícius Rossignoli, chef e especialista na gastronomia do Cerrado.
Como o Cerrado pode ser útil para combater a fome no Brasil
Na região do Cerrado brasileiro, encontram-se em abundância inúmeros frutos, fauna e flora, entre sementes, flores, raízes, rizomas, hortaliças e alimentos. O bioma é conhecido pela sua diversidade e riqueza natural.
Ao mesmo tempo, o Cerrado também é um dos biomas mais ameaçados, em razão dos desmatamentos e do extrativismo. Se bem explorado e mantendo sua preservação, o Cerrado pode ajudar a combater a fome no Brasil, por conta dos inúmeros recursos que vem dali.
De acordo com Vinícius, mesmo com toda essa riqueza, o Cerrado ainda não é reconhecido pela Constituição Federal como um bioma que necessita de preservação.
“Por isso, é preciso inserir o Cerrado como bioma que necessita de atenção e, em paralelo com esta ação, incentivar pesquisas por parte de empresas como a Embrapa para a produção em larga escala desses alimentos, além de realizar campanhas de incentivo ao uso e o resgate da cultura alimentar tradicional”, sugere.
Ele ainda faz um alerta sobre a importância de preservar o Cerrado e conservar a biodiversidade e identidade do bioma.
“Consumir o Cerrado de maneira responsável e respeitosa é de vital importância, uma vez que além de preservarmos nosso povo que cada vez mais sofre com os efeitos decorrentes da pandemia, também estaremos conservando a biodiversidade, pois a demanda proporcionará mais produção e por consequência a manutenção das espécies. Além disso, o impacto ambiental é drasticamente reduzido, tanto pela emissão de carbono quanto pela necessidade de transformação do solo causada pelos defensivos, corretivos e fertilizantes químicos”, reflete.